ELIZANDRA SOUZA

segunda-feira, 4 de junho de 2012

Bicicletas X Carros - Mais uma vez aceitamos o desvio de nossos olhares!

O movimento de apoio ao uso das bicicletas na cidade de São Paulo é mais uma forma de desvio da responsabilidade pública em oferecer um transporte público decente. Como uma cidade com tantos veículos se torna refém das bicicletas?

O uso dos carros nas grandes cidades há anos não pode ser considerado um luxo ou uma forma de status social. O carro é hoje, muitas vezes, o único meio de transporte viável para os cidadãos. É claro que aquele que pode se locomover com o carro não vai escolher andar como "sardinha enlatada" nos transportes oferecidos pelo governo. Além da péssima conservação, ainda são transportes extremamente demorados e caros, que não viabilizam a locomoção pela cidade. Muitas vezes, para ir de um bairro a outro é necessário o uso de duas conduções, enquanto que com carro se leva 15 minutos.

Sim, é mais tranquilo andar de carro, mas não é fácil, tampouco barato. O combustível é caro, o imposto é absurdo e ainda temos a inspeção veicular - que é melhor nem comentar! Contudo, utilizar os ônibus é bem pior.

Para desviar nossa atenção desta condição precária do transporte público, o governo, através dos movimentos alienantes, toma seu lugarzinho neste "bonde" e apoia qualquer coisa que o desobrigue de sua responsabilidade. Porém, sendo a bicicleta uma solução, coloquemos os milhares de usuários de ônibus e metrô, que se excedem nas estações, em bicicletas pela cidade.

É claro que os acidentes aumentaram. Mas não é, simplesmente, pelo desrespeito generalizado, e sim pelo maior número de exposição. Quanto mais carros nas ruas, mais acidentes automobilísticos.

Quanto mais motos, mais acidentes com motociclistas. Quanto mais bicicletas, mais acidentes com ciclistas. Contudo, atrelado a isto, vem a questão da desigualdade de direitos. Aqueles, considerados ‘minorias' ou ‘frágeis socialmente' são dotados de direitos que se sobressaem aos direitos dos demais.

Esquecemos, neste sentido, do desrespeito à própria cidade, da qual lhe foi retirado o direito ao planejamento urbano. São Paulo, por exemplo, é uma cidade que cresce pelo caos. Não há nenhuma forma de planejamento nas construções de vias públicas e, mais ainda, nos edifícios residenciais e comerciais.

Há bairros, como o de Santa Teresinha, na zona norte, onde estão sendo construídos 9/ 10 condomínios com 30/ 40 ou mais apartamentos por condomínio. A conta é simples de ser feita: estes apartamentos não custam menos de 800 mil reais, portanto, não morarão famílias sem carro ou que, necessária e preferencialmente, utilizam transporte público. Raras serão aquelas famílias com apenas um veículo. Teremos, por baixo, mais 500 carros nas ruas do bairro daqui alguns meses e as vias públicas continuam as mesmas de 30 anos atrás. E não adianta jogar esta responsabilidade para as construtoras, pois todos nós pagamos impostos para que as vias funcionem. As construtoras não podem, simplesmente, serem responsabilizadas pelas benfeitorias para mobilidade na cidade, pois assim, a barganha, para não dizer a corrupção, será inevitável. A pergunta a se fazer é: Quem dá o alvará para estas construtoras? Baseado em qual planejamento urbano os alvarás para construção desses condomínios são permitidos?

Agora, se a bicicleta, enquanto meio de transporte é a solução, então pensemos: e se todas essas pessoas resolvessem sair com bicicletas. Mães levando seus filhos nas escolas, crianças voltando para casa, executivos engravatados sobre bicicletas, médicos e enfermeiros chegando aos hospitais em suas bicicletas... Ou, então, coloquemos todos estes moradores no ônibus dos bairros ou no metrô, que já é insuficiente. Será que realmente a alternativa é deixar os carros em casa?

Alienados estão estes que contabilizam as ciclovias, que só servem para causar mais trânsito nos finais de semana. Para chegar a muitas ciclovias, as pessoas usam carros. Ou, senão, andam com suas bicicletas em ruas não apropriadas para isto.

Não vamos nos enganar! Grande parte das ruas não comportam ônibus, carros, motos e bicicletas. Muitas, mal comportam carros e motos.

Ao bel prazer de políticos e grupos isolados de pseudo defensores do meio ambiente contempla-se leis de direitos parciais, indicando a mais pura incapacidade de pensamento social e democrático.
São Paulo é uma cidade que não possui nenhum planejamento urbano. Não sei se por falta de profissionais habilitados para a atividade ou se é descaso próprio do percurso dos governos que temos tido.

Uma cidade onde proliferam construções imobiliárias, não se fala em projetos de novas vias ou aumento de linhas de ônibus – e o metrô está se tornando uma piada. Andamos em ônibus sucateados, com 10/ 15 anos de uso e que não parecem passar pelo roubo da vistoria (obrigatória para os carros). E para construção de vias de escoamento para saída dos bairros mais isolados seria necessário desapropriar centenas de casas. Contudo, enquanto isso, as construções crescem exageradamente e sem controle.

A cidade é suja, mal organizada, com ruas estreitas, mesmo onde há grande circulação de carros e ônibus. Mais uma vez, a solução feita através do "jeitinho brasileiro". Há regiões que não temos para onde "fugir": uma ou duas vias servem de escoamento dos bairros para o centro ou para outras partes da cidade.

A lei "cidade limpa" foi usada somente para usurpar pequenos empresários e comerciantes, pois ela não é base para as políticas públicas de verdade, onde a limpeza deveria ser generalizada, ou seja, ruas sem buracos, faixas e sinalizações bem visíveis, calçadas apropriadas para mobilidade, funcionamento de semáforos (que aliás é um artigo a parte de tão vergonhoso) – todas essas coisas significam organização , consequentemente mais limpeza e respeito.

A falta de organização e planejamento urbano é tão grave quanto os desvios de verbas da saúde, da educação e do transporte. Desrespeito, desorganização, sujeira, insegurança e caos caminham de mãos dadas. Estão atrelados uns aos outros.

O movimento pró-bicicleta, como mais um superdireito, torna-se aos poucos mais uma ação fascista que desconsidera o outro na sua vontade, necessidade e possibilidade, demarcando assim que a convivência democrática está na via do impossível. E ainda, tenta encobrir nossos olhos, semicerrados, do verdadeiro caos.

Além disso, andar de bicicleta não é para qualquer um, em qualquer lugar. Nas vias das grandes cidades é ainda pior. É preciso ter destreza, habilidade, cuidado e, principalmente, respeito à própria vida – e ainda, normas de segurança.

O que acontece hoje com os ciclistas é a mesma coisa que acontece com os motociclistas: falta de respeito com a própria vida, colocação de si como vítima incondicional, uso de manobras proibidas e arriscadas, falta de legislação coerente. Pessoas andam de bicicletas à noite, pelas ruas escuras, sem nenhuma sinalização luminosa e acreditam que estão certos, simplesmente, porque há outras pessoas que dizem que são minoria e fragilizados. Os motoristas devem adivinhar a presença de ciclistas e aquilo que vão fazer.

Sem perceber, as denominações grupais que tentam instaurar uma visibilidade diferenciada a partir da crença de serem exceções, somente comprovam que há uma regra, uma oficialidade, e, portanto, seus ideais e características nunca serão regras.

Contudo, mesmo sendo considerados minorias, para se valerem do bom convívio social, precisam ter regras específicas para existirem. Então, quais são as regras para os ciclistas? Poderão andar entre os carros como fazem as motos? Poderão cortar os carros, entrando na sua frente sem avisar? Poderão andar em qualquer faixa? Poderão andar em duplas, trios ou grupos na sua velocidade, desconsiderando o bom andamento do trânsito (pelo menos nos poucos momentos em que é possível exercer alguma velocidade)?

Então, quais serão os deveres dos ciclistas? Quais as habilidades deve ter um ciclista para andar nas ruas das cidades? Qual a idade mínima para circular com segurança? Com quais seus acessórios de segurança?

E o mais importante: sendo considerada a bicicleta um meio de transporte, que deve seguir normas de trânsito, qual será sua contribuição social, ou seja, quanto pagarão de imposto? E mais, qual o tipo de identificação deve ter uma bicicleta para reconhecimento de seu condutor? Ou os ciclistas são melhores e superiores em relação a todos os outros mortais que pagam ipva, licenciamento e usam placas identificatórias para poderem conduzir nas cidades? Impostos estes, que teoricamente, deveriam servir para melhoria do trânsito como um todo. Haverá multa para os maus condutores de bicicletas?

Será que estamos mesmos preparados para dividirmos espaço com mais um meio de transporte? Será que a cidade tem estrutura para comportar esta situação? Ou continuarão fazer o que sempre fazem: retiram o espaço de uns para dar a outros?

Acho mais esquisito ainda, o atrelamento que se faz entre educação e punição. O motorista – e somente o motorista – deverá ser multado. Talvez os grandes teóricos e os diversos pensadores da pedagogia e da educação atual devam ficar de cabelos em pé com a constatação de que todos nós humanos não nos educamos, a não ser quando há punição, ou multa. Somos seres incapazes de aprender pelo entendimento. Compreendemos a necessidade das coisas quando isto dói em nós, seja no corpo ou no bolso.

As leis de trânsito e o próprio funcionamento do trânsito das cidades comprovam que o atravessamento do aprendizado se faz pela dor. Portanto, podemos concluir que se as pessoas ainda aceitam o desconforto dos meios de transportes (e não é só isto, mas todo o conjunto de arbitrariedades que nos são impostas) é porque ainda não doeu o suficiente para que haja outra atitude. O povo brasileiro, ainda não se cansou, não sofreu o bastante.

Longe dos passeios automobilísticos, os carros são usados, principalmente, como locomoção para o trabalho e para a escola. Se pensarmos que durante as férias o trânsito melhora, podemos concluir (ironicamente, é claro) que a educação atrapalha o trânsito! Tal qual o trabalho atrapalha a mobilidade de toda a cidade.

As pessoas que utilizam o carro, o fazem por necessidade, por isso não vemos ninguém ficar no trânsito por prazer. Ninguém diz: "Que felicidade, 2 horas de congestionamento!" Daqui a pouco, os governos, nos trarão como solução o rodízio de trabalho: pessoas nascidas em dias pares, trabalham nos dias pares e pessoas nascidas nos dias ímpares, trabalham nos dias ímpares! Vamos esperar!

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