ELIZANDRA SOUZA

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

VOZ ADOLESCENTE

Pesquisa sobre a constituição da adolescência hoje.


Ligue e deixe seu depoimento:


11- 40631425


www.vozadolescente.com.br


Não é necessário deixar identificação e somente a pesquisadora escutará os depoimentos.
Pesquisa para mestrado da USF, Campus Itatiba

terça-feira, 9 de novembro de 2010

PADRÕES E DIFERENÇAS

PADRÕES E DIFERENÇAS

O uso exagerado de padrões de beleza, comportamento, estilo de vida, atitudes, pensamentos e outros desconsidera o ser na sua essência. Restringe o indivíduo na concepção de que das diferenças não se extrai qualidade.

A padronização está ‘enlouquecendo’ os indivíduos que preferem deixar de lado sua subjetividade para caminhar pela face dos iguais. A sociedade determina um padrão e escraviza a si mesma nessa obsessão.

Os padrões podem ser, e são, estímulos para a sociabilidade e, algumas vezes, para colaborar numa elevação da auto-estima, pois desenvolve no indivíduo a aproximação com o bem-estar. Contudo, a vaidade como vício, a não observação dos limites, a utilização do corpo como máquina, como única forma de se sentir bem ou ser aceito é o engano posto como objetivo.

Quanto mais o olhar do indivíduo se volta para o exterior, mais a percepção de si mesmo, enquanto um ser subjetivo, um ser do desejo, fica enfraquecida, se estabelecendo como perdida. A fantasia, que marca o sujeito, que acredita que a posição sabida é aquela que se faz mediante o que se pode mostrar, se mistura com a ilusão de só poder ser quando algo se mostra.

As questões e os conflitos que cada pessoa desenvolve ao longo da vida são únicas, individuais e, portanto, subjetivas. Isto significa que tentar fazer soluções padrões para conflitos subjetivos não traz resultados positivos.

Os padrões estéticos, comportamentais e de pensamentos utilizados como vitrine para inserção social podem simbolizar uma forma de segregação, pois aqueles que não os seguem, não fazem parte da sociedade. Almejar um tipo de bem-estar onde os sacrifícios internos e externos ultrapassam a realidade e a capacidade de amadurecimento não se aproxima da satisfação pessoal.

A exaltação do corpo, seja pelo culto à beleza, seja através de comportamentos, não possibilita ao indivíduo a aceitação de sua própria imagem. Por isso, na relação especular (do ser diante do espelho) ele não se reconhece. Mesmo admitindo que o corpo é parte do ser, ele não é o ser, não é o todo.

Fazer parte da sociedade ou de um grupo social é, claro, participar de costumes e pensamentos que norteiam este ou aquele grupo e que os diferenciam - culturalmente. O problema não está nesta participação, está no exagero onde existe o distanciamento dos limites. Onde fica a dúvida do certo e do errado, do bem e do mal. Onde, no lugar de uma posição afirmativa em relação à vida existe um ponto de interrogação. A pergunta que cada um faz a si mesmo sobre sua própria essência.

Resolver os conflitos internos e ultrapassar seus obstáculos é a possibilidade de estabelecer consigo boa relação, na medida em que o caos interno não se esclarece, nem se esgota pelas soluções externas.

Ter a maturidade para domar os exageros, aceitar sua própria imagem, suas diferenças, assumindo sua subjetividade e transpor isto para o mundo é o que chamamos de amar-se ou acreditar-se, onde se mostra a alma através do corpo.





Elizandra Souza

Psicanalista

www.elizandrasouza.com.br

O paterno e o materno em psicanálise

O Paterno e o Materno em Psicanálise


A existência do conceito de constituição do sujeito faz retomar a idéia dos constituintes desta formação, que se entende pelo fato dos seres humanos terem outros sujeitos como participantes primordiais de sua própria organização.


O humano é encarnado das construções de todos os outros sujeitos que o rodeiam, formando uma hereditariedade de constituições, atribuída aos emaranhados de posições, afetos, palavras e olhares que se presentificam num sujeito único.


De todas as possibilidades de interferências que os seres humanos estão sujeitos, as funções materna e paterna se figuram principais e não se esgotam na infância. Dali advém o sujeito.


O novo, porém velho. Que traz em si a constituição familiar. Aquele que primeiro se assujeita às inferências do outro, numa relação contínua de sujeito-objeto. Deve a criança ser a continuidade da mãe, que neste primeiro instante se sente inteira, como se fosse o filho aquilo que lhe completa.


A criança é marcada desde o nascimento, pelos afetos, carinho e olhar materno, que possibilita a inscrição do desejo daquele que ocupa esta função tão fundamental. Na completude da mãe, a criança é parte e extensão desta, que se apropria dela até que aconteça o corte.


Nascem imersas num campo recheado de desejos e fantasias inconscientes dos pais, assim como suas renuncias e traumas que são carregados de imagens, símbolos e emoções.


A função materna caracteriza para o bebê a possibilidade de um amor e proteção constante e sem fim. Quando olhado amorosamente, sente-se seguro para fechar os olhos e dormir, por exemplo. A mãe ao amamentar, embalar e cantar deixa impressões eternas dos afetos que são transmitidos nestes momentos.


Apesar de parecer passivo o assujeitamento, cada marca se constitui como um movimento para fazer emergir um ser capaz da subjetividade.


A mãe tenta satisfazer a criança, e a satisfaz, primeiro com o biológico, pela amamentação, pelo alimento necessário, mas o faz, sem perceber, também, pelos seus afetos, seus desejos, seus sintomas, que se estendem ao filho para serem simbolizados. Nesta simbolização a criança pode apreender o fato crucial para sua existência: a ter sido ou não uma criança desejada.


O pai exerce a função de corte da simbiose mãe-bebê para retirada da criança do assujeitamento materno e assim possibilitar a organização dos elementos que vão marcando e formando um novo sujeito.


O pai, enquanto função, deve sustentar os atributos a ele conferidos pela mãe e se presentificar perante o filho para garantir a este a saída da totalidade materna.


A função paterna possibilita a inserção do sujeito na cultura. Na ligação primeira com a mãe, o sujeito não se move para além daquele mundo mãe-bebê, onde o acolhimento e o vínculo instaura esta posição de um ser do outro. Um como extensão do outro.


As funções acima descritas são desenvolvidas pelas pessoas que rodeiam a criança ao nascer. Mesmo nas impossibilidades de se saber pai e mãe, há quem ocupe estes lugares a partir das primeiras inscrições e respostas da criança. As funções podem não recobrir o sujeito, ou não se efetuarem de forma esperada.


O pai reestabelece para a mãe a posição de mulher, já que o filho não completa inteiramente a falta da mãe enquanto mulher, esta, então se desprende do filho para que este possa ser um na cultura. A ruptura materna atesta a criança como um ser não completo e por não ser completo existe algo que lhe falta. Nesta falta manifesta, se funda o desejo. Só existe desejo, se existir a falta.


As experiências fundamentais se estabelecem pela ruptura e pela falta, como a separação ao nascer, o momento do desmame, o afastamento materno pelo corte paterno, que possibilita ao sujeito a elaboração de sua subjetividade.


É a esse conjunto de fatores da posição da mulher enquanto mãe e do homem enquanto pai, que existe para a criança a possibilidade de se tornar um sujeito desejante ou pairar na posição de objeto ou sujeito sem desejo – um nada.


Elizandra R. Souza
Psicanalista

A visão psicanalítica diante da abordagem coaching

A visão psicanalítica diante da abordagem coaching



O coaching é uma nova modalidade de subjetivação. Talvez, por isso, as pessoas confundem tanto o coaching como uma abordagem terapêutica, porém não é assim que este processo funciona. Diferente da psicanálise, que permite uma ampliação de visão e posicionamento, o coaching trabalha de forma pontual, portanto não pode ser considerado uma forma de terapia.



Contudo, aproximando-se da psicanálise, o coaching utiliza a palavra como elemento principal no seu processo, com uma abordagem muito mais diretiva, mas ainda colocando o cliente a falar sobre suas questões, suas dúvidas, suas dificuldades, sobre as coisas que o incomodam ou inquietam.



Neste momento, onde a fala está totalmente presente, as questões pessoais podem aparecer, e quase sempre isto acontece, desviando o foco do trabalho do coaching. Mas é uma grande oportunidade de perceber a emergência do sujeito. Talvez, por isso, as pessoas confundem tanto o coaching como uma terapia.



Porém a história e a forma de trabalho, do coaching, da terapia e da psicanálise não podem ser confundidos. Mesmo um profissional que trabalhe com ambas abordagens, deve sempre esclarecer aos seus clientes e pacientes o quê exatamente significa cada modalidade, qual a forma de trabalho e, principalmente, quais os limites entre elas.



O coaching, a partir dos anos 80/90, se expandiu e aumentou em número de profissionais e de clientes. Muitos procuram os profissionais coaching ( que significa treinador, num sentido de conselheiro ou facilitador para encontrar soluções de problemas e clareza de potenciais) para diagnosticar e avaliar situações e problemas, e definir as ações possíveis.



Esta procura tem gerado um aumento de profissionais sem ou com pouca qualificação, indicando o aproveitamento da demanda do mercado e a não definição do tipo de profissional que deve ser procurado para este trabalho. Algumas pessoas se utilizam de uma miscelânea de instrumentos e diplomas, mas que não dirigem especificamente sua própria profissão, sendo incoerente com a posição de um coaching.



Esta modalidade de trabalho tem suas especificidades e não pode ser tratada com a simplicidade que comumente encontramos. Este trabalho exige do profissional o conhecimento nas áreas de recursos humanos, administração, psiquismo, comportamento e, muitas vezes, economia. Isto porque, o trabalho é direcionado para a melhor performance profissional de homens e mulheres, que já atuam ou que queiram posicionamentos em cargos ou níveis mais elevados dentro de suas empresas



Algumas situações demandam mais o trabalho de um coach:

promoções que não chegam;
jornadas de trabalho excessivas (principalmente nas jornadas das mulheres);
paralisia na carreira;
dificuldade de relacionamentos com superiores ou funcionários;
manter empresa própria ou seguir carreira;
dificuldade em liderar ou distribuir tarefas;
percepção de não reconhecimento;
preocupação com perda de emprego;
falta de desafios;
direção de carreira;
etc.


O coaching permite esclarecimento dos limites do cliente e de suas capacidades, por isso acontece individualmente, diversificando do trabalho de treinamento, mais conhecido nos recursos humanos.



É importante ressaltar que coaching não é terapia, muito menos psicanálise, apesar de muitos profissionais, atualmente, alimentarem esta confusão, tornando o trabalho equivocado e ludibriando clientes. A abordagem coaching tem um objetivo específico, por isso é mais pontual e, principalmente, ligado a questões profissionais. As emergências pessoais devem ser apontadas e deixadas para um outro tipo de trabalho, por exemplo o psicanalítico.



No coaching, a busca é por uma meta, através da exploração do potencial do cliente, visualizando o presente e o futuro. O coaching pode utilizar-se de várias técnicas e métodos, diferentemente da psicanálise, que tem método próprio.



Apesar disso, os conhecimentos teóricos da psicanálise podem ser explorados pela abordagem coaching. Isto porque durante o trabalho analítico, o analisando serve-se de maior subjetivação e maturidade. “A psicanálise nos permite ter uma outra visão sobre a vida, as pessoas e a sociedade. Com a psicanálise temos posicionamentos diferentes. Não nos transformamos em pessoas melhores ou mais boazinhas, mas tomamos mais consciência das coisas a nossa volta, isto é, temos um reconhecimento maior sobre nossos limites e nossas vontades... Tornamo-nos pessoas mais responsáveis pelos nossos atos... temos maior percepção sobre o que fazemos e sobre as consequências de nossos atos, por isso, deixamos de nos culpar desnecessariamente... agimos mais a nosso favor, mas sem prejuízo de ninguém, pois sabemos da nossa responsabilidade.” (Souza, Elizandra)



O profissional coach, que conhece a psicanálise, tem uma ferramenta a mais e mais complexa, mas o bom profissional jamais fará análise com seu cliente durante o trabalho coaching, mesmo porque, o trabalho psicanalítico é mais complexo e longo. Saberá qual o limite entre coaching e análise e deverá pontuar isto ao seu cliente.









Elizandra Souza - Psicanalista, Professora, Diretora da Comissão de Ética do Sindicato dos Psicanalistas do Estado de São Paulo, Escreveu o livro “Aproximando-se da Psicanálise num jogo de perguntas e respostas”.

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CHEGANDO AO LIMITE!

CHEGANDO AO LIMITE!



A síndrome que afeta os profissionais









Diante de tantas nomenclaturas inventadas ou designadas para as patologias modernas, surge mais uma, a síndrome de burnout. O que nos faz pensar se são as pessoas com determinados sintomas específicos que demandam nomes, conceitos e tratamentos diferenciados, ou se são a partir dos novos nomes de patologias que emergem mais doentes.



Quando relatamos os sintomas desta ou daquela patologia, qualquer um de nós se reconhece e, muitas vezes, até se autodiagnostica doente. Mas as condições gerais, que instauram as patologias da vida moderna, via de regra evidencia o descaso que os sujeitos têm consigo, com seus corpos, com seus sentimentos, com seus conflitos internos.



A pouca importância dada ao ser por ele mesmo começa a ser a característica mais acentuada em diversas patologias que entrelaçam as questões físicas e psicológicas, implicando o sujeito num outro modo de operação comportamental e de deslocamento subjetivo.



A síndrome de burnout refere-se a um conjunto de sintomas que ocorrem em profissionais que na dedicação intensa ao trabalho, tentam ultrapassar seus limites, até por desconhecimento, chegando ao colapso. Como na famosa frase “não agüento mais”.



Para além do estresse, o burnout tem o sentido de exaustão crônica relacionada ao trabalho, onde profissionais vivem tensão emocional constante, são exigidos atenção constante e muitas responsabilidades. Além disso, existe um forte e constante sentimento de discrepância entre aquilo que o profissionais percebe, enquanto atividades realizadas e a percepção de não reconhecimento por parte de superiores, colegas ou outros envolvidos.



As condições organizacionais nem sempre, ou quase nunca, permitem que o sujeito integre todas as suas dimensões subjetivas. As demandas profissionais em contraponto com as perspectivas de satisfação impactam na saúde do trabalhador lentamente, muitas vezes sendo invisíveis num primeiro momento ao sujeito.



Cada profissão exige do sujeito um conjunto de recursos subjetivos e interpessoais para que possa exercer de maneira satisfatória seu trabalho, mas não indicam caminhos, meios ou instrumentos para produção do cuidado de si, se movimentando, então para um trabalho muito solitário e somente quando o executivo se dispõe integralmente a olhar-se.



De acordo com Marx, o homem quando trabalha, põe em movimento as forças de seu corpo e imprimi sua forma ao trabalho, ao mesmo tempo que modificas os recursos da natureza externo, é modificado internamente. O trabalho faz parte do processo de construção do sujeito, participando do sentido dado por ele à vida. O sujeito se singulariza pelo trabalho e se identifica com o mundo.



Custos com a não assistência, demora na procura de tratamento, de ajuda tornam os transtornos emocionais e subjetivos mais incapacitantes e prolongados. Questões políticas, sociais, éticas, culturais, econômicas inviabilizam a compreensão dos conflitos emocionais, ou seja, ainda há muito preconceito e uma certa crença em acreditar que tudo se resolve sozinho ou, simplesmente, que os problemas consigo mesmo passam.



Hoje é extremamente evidente que o profissional não reage mecanicamente aos fatores externos de trabalho e que sua satisfação vai muito além das compensações salariais. A abordagem subjetiva é melhor avaliada e analisada nos processos de trabalho e de saúde profissional.



Uma análise sobre o trabalho ou a profissão do sujeito, a partir da psicanálise, nos leva a pensar no quanto a carga psíquica pode ser fonte de prazer e bem-estar quando sua descarga é bem sucedida. E, por outro lado, quando há tensão demais, sem descarga possível, o desprazer se evidencia, gerando sofrimento. Isto significa aqueles acúmulos de atividades, decisões, atitudes, comportamentos, exigências que estabelecem os executivos com seu trabalho. Portanto, a insatisfação tem maior relação com o sofrimento do profissional e seus conflitos internos, que tornam obscuros muitos processos externos.



A psicanálise contempla esta interrelação do interno e do externo, do físico e do psíquico, do comportamento e das emoções. Quando algo está acontecendo, em qualquer um destes aspectos, é importante que o sujeito se veja integralmente, ou seja, em todas as suas dimensões subjetivas e objetivas.



O esgotamento surgido na síndrome de burnout afeta aspectos físicos, emocionais e cognitivos. Indicativos desta patologia são desatenção, nervosismo, fadiga, problemas cardíacos, ansiedade, disfunção digestiva, distúrbios do sono, intolerância, problemas respiratórios, tendência ao excesso de álcool, drogas ou medicação, aumento de colesterol, palpitações, dores, infelicidade, medo, insegurança. Sintomas que são comumente confundidos com o estresse, mas é muito mais que isto, pois as situações estressantes são crônicas e relacionados ao trabalho.



As características da síndrome de burnout, segundo pesquisadores como Malash, Delvaux, Lambert, entre outros são:



1- exaustão emocional – energias esgotadas, sentem que não podem fazer mais, irritabilidade, cansaço, sinais de depressão e/ou ansiedade, propensão a acidentes, abuso de álcool, surgimento de doenças psicossomáticas.

2- despersonalização – sentimentos e atitudes negativas, insensíveis e de cinismo às pessoas, desconsideração das relações afetivas.

3- falta de envolvimento pessoal no trabalho – evolução negativa no trabalho, baixa auto estima.

4- Depressão – ausência de prazer em viver (breves, moderados ou graves).



Olhar-se, cuidar-se e procurar profissionais adequados são as primeiras iniciativas para um tratamento. Nunca abrir mão dos profissionais que trabalham com o psiquismo ou as emoções, pois mais do que tratar os sintomas, é necessário conhecer as causas e saber lidar com as dificuldades de transformação. E quando atingem o corpo, o físico é preciso procurar os profissionais indicados, como cardiologistas, gastroenterologistas, neurologistas, dermatologistas, principalmente para afastar qualquer indício de coisas mais graves.



Elizandra Souza - Psicanalista, Professora, Diretora da Comissão de Ética do Sindicato dos Psicanalistas do Estado de São Paulo, Escreveu o livro “Aproximando-se da Psicanálise num jogo de perguntas e respostas”

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O HOMEM DIANTE DAS RELAÇÕES DE CONSUMO

O HOMEM DIANTE DAS RELAÇÕES DE CONSUMO



Como suprir a carência do ‘ter’ na sociedade atual?



Em meio a tantos instrumentos de consumo, o sujeito se investe, cada vez mais, na roda do endividamento. Às vezes pela necessidade, outras por oportunidade, ou ainda, por descontrole. Endividar-se pode ser a única opção para muitos, enquanto outros escolhem e absorvem as dívidas como impulso de vida.



Existem, é claro, questões de profundidade e complexidade quando analisamos mais detalhadamente estas construções de relação. Numa visão psicanalítica, salientamos os aprendizados das relações anteriores (na infância), que influenciam ou geram os modos atuais.



As coisas não se produzem sozinhas. São criadas através das relações entre pessoas, objetos e posições. Assim, também acontece com os sintomas sociais, que são construídos e demonstram uma forma de experimentação de uma população ou de uma cultura.



Esta sociedade, em que a supervalorização em torno do ‘ter’, num movimento quase histérico (quando não é realmente), produz sujeitos que não aceitam suas carências, seus vazios, suas fendas. Enquanto vivenciam a cultura do ter, os sujeitos acumulam bens e dívidas e se distanciam do ‘ser’, do olhar para si e do cuidar de si.



O sujeito está desaparecendo, fazendo afunilar a relação ser e ter. Se o sujeito não responde mais por si, quem responderá? Desaprendemos a dizer quem somos nós, mas contamos facilmente o que temos. Se existem hoje, até patologias que se engendram pelas questões profissionais, então também podemos considerar os aspectos patológicos das relações de consumo.



Para além do ‘ter’, existe um sujeito que não se sabe, mas que está em busca deste conhecimento, porém, talvez, pelo caminho mais tortuoso. Por outro lado, prejudica as relações com as pessoas e demonstra sua formação incompleta.



Os objetos a serem consumidos, vão e vem, melhores, menores, mais coloridos. Esta transição de objetos nos indica o quanto os valores estão perdidos, e mais ainda, a impossibilidade do sujeito em resgatar o valor das coisas. Descartar objetos é tão comum que quase não percebemos o quanto fazemos isto.



O montante de bens adquiridos, principalmente, os acessórios, constrói, paralelamente, o desperdício. O celular deste ano tem tecnologia mais avançada e faz com que o do ano passado já seja obsoleto, porém, não irá mais servir para o ano que vem.



Mas o que podemos pensar sobre esta falta de valor que damos às coisas? Se descartamos objetos por perderem valor de interesse, qual será nosso sentimento de valorização para aquilo que, aparentemente, não nos interessa, como por exemplo, as pessoas? Quando ornamentamos os sujeitos do ‘ter’, qual olhar teremos para sujeitos do ‘não ter’?



Hoje, os endividados são, ao mesmo tempo, produtos e produtores da sociedade. Isto significa que aquele que se diz ou é dito devedor, apenas responde, de um certo lugar, ao constructo social atual. Seja pela necessidade, pela facilidade ou, mais inconscientemente, como forma de (re)conhecimento, endividar-se é um meio de sobrevivência.



A sucessiva criação de dívidas aponta fatores variados e não mais é considerada, simplesmente um despropósito do endividado, por isso a relação entre devedor e credor abrange aspectos sociais, econômicos e, principalmente, aspectos culturais. Isto ordena um novo olhar sobre o devedor, que não mais pode ser desmoralizado, ao contrário, é visto hoje como participante ativo da economia do país.



Diante do devedor, o credor somente está do lado oposto, num determinado momento, neste jogo de posições. Posições que são ocupadas em certas situações, e onde os sujeitos circulam e transitam, como qualquer movimento natural da vida. Então pensamos, será possível, hoje, viver sem ter dívidas?



Devedor e credor estão intimamente ligados, tal qual todos os outros opostos conhecidos: amor e ódio, bem e mal, dia e noite, quente e frio, onde a inexistência de um, esgota todas as possibilidades do outro existir.



Estamos diante, mais uma vez, de nossa incapacidade em ‘não saber’. Procuramos respostas para tudo. E acreditamos que muitas respostas estão nos objetos que podem e devem ser consumidos. Não damos tempo para nossa incompletude. Nossa busca é desenfreada pelo pertencimento, onde não cabem mais questões como ‘quem sou eu’ ou ‘o que quero para mim’.



Se, respeitar é olhar para as coisas por outro ângulo, de outro lugar, o respeito mútuo entre estas posições subjetivas e sociais é condição essencial que suplanta a concordância das partes e viabiliza sua perpetuação.


Elizandra Souza
Psicanalista
Diretora da Comissão de Ética do SINPESP
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segunda-feira, 19 de julho de 2010

REFLEXÕES SOBRE O CRIME PASSIONAL

Paixão, palavra que nos remete aos extremos do ser, seja pelo amor ou pelo ódio, seja pelo bom ou pelo mau. A paixão é uma forma de fixação, onde a pessoa idealiza um objeto (pessoa, idéia ou comportamento) e o coloca no lugar do ideal de ego (que, de forma simplificada, significa a forma como o sujeito é ou quer ser).



A paixão, em sua essência, pode causar alienação do sujeito, que abandona o si mesmo, causando enfraquecimento do eu e supervalorizando o objeto que se torna uma necessidade. Uma pessoa apaixonada não se sente mais forte, mais bonita ou mais querida por si mesmo, ela precisa do olhar do outro amado. Ela precisa que este outro lhe diga sobre seu bem-estar.



Apesar de, num primeiro momento, trazer vivacidade ao apaixonado, a paixão se insere pela via da fixação, que promove ao sujeito um prazer indizível, pois nem ele sabe sobre o prazer que lhe causa, tampouco, como isto aconteceu. Por permanecer na fixação, a paixão não é um sentimento sublime, não se configura no lado positivo da vida e não celebra o amor.



Se tomarmos a paixão como abandono do eu em direção ao objeto, temos, então, uma pessoa ‘não inteira', que por isso, se afasta da realidade e desconsidera os outros objetos do mundo e as outras relações. A paixão está no fanatismo, nas patologias, nos movimentos violentos, na figura dos egoístas.



A pessoa apaixonada, por vezes, perde o senso crítico da realidade e a capacidade de avaliar o certo e errado, o bem e o mal. Em encontros com sua imaginação, beirando o delírio, o apaixonado justifica seus comportamentos e pensamentos, tal qual, justifica os do objeto amado, considerando sempre o sentido de apreensão do objeto, ou seja, a tomado do outro para si.



O movimento egoísta é percebido na fala do apaixonado: "eu te adoro, eu te quero"; "você é a coisa mais importante para mim"; "não posso viver sem você"; "quero você só para mim"; "você é minha". Frases, que conforme revela o estado da paixão, desconsidera o desejo do outro.



Na contradição entre o egoísmo e a proteção, muitas pessoas acreditam no bem supremo do apaixonado e, por vezes, é neste momento que não percebem quando há algo patológico. Alvos de crimes, ditos passionais, quando percebem, já é tarde.



Para que não seja patológico (ou não se torne), é necessário que o sujeito não se abandone e não se direcione para este sentimento de forma totalitária. Há que existir uma alternância entre o estado de paixão e a capacidade de razão.



A paixão é benéfica quando o sujeito não se destitui de si mesmo e não se afasta da realidade. Quando consegue equilibrar as explosões do estado apaixonado com a relação com o mundo externo e interno. Podendo, neste equilíbrio, adquirir potencial para um bem querer maior, que não anula totalmente as inseguranças próprias do ser, mas que se insere com maior maturidade.



O crime passional é caracterizado pela relação de paixão entre o criminoso e a vítima, independente do tempo de relação ou mesmo da realidade objetiva desta relação – em alguns casos esta "relação de amor" somente existe no delírio do criminoso, como acontece na paranóia.



Ainda que, o criminoso se encha de motivos éticos, morais, financeiros para justificar seu ato, não é possível desrresponsabilizá-lo ou desculpá-lo. Estes motivos explicam processos internos, mas não encobrem o ódio, a possessividade, o poder, a intolerância, a vingança que o criminoso carrega pela vítima.



Estes criminosos são, na sua maioria, homens que não suportaram a frustração da traição ou da troca. E precisam demonstrar a subjugação da mulher e a constatação de sua honra. Isto é facilmente entendido pela cultura, pois as mulheres são, em geral, mais compreensivas, mais sensíveis e mais acolhedoras, podendo aceitar com mais tranqüilidade as atitudes do homem, como, por exemplo, nos deslizes de traição.



Por outro lado, grande parte dos homens tem mais características de atuação do que de reflexão. A masculinidade ainda é entendida e demonstrada pelo poder, pela dominação, pelo controle, pela atuação sexual, pela agressividade. A exemplo disto, temos muitos homens que quando perdem o emprego, a posição social ou o controle de suas finanças, desenvolvem distúrbios sexuais, como a impotência. O homem não aprendeu a lidar com os sentimentos e as emoções, por isso quando há angústia, há incapacidade.



Entendendo a paixão como tomada do objeto enquanto ideal de ego, no crime passional, este objeto (figurado na pessoa) é o causador da dor, porém de uma dor objetiva. A eliminação do objeto cessa com o sofrimento.



O criminoso passional não sabe lidar com seus sentimentos de dor, nem de amor. Não consegue utilizar seu simbólico para resolver seu sofrimento. Quando diz: "é uma faca em meu peito", é como se a faca realmente estivesse lá, portanto para desaparecer com a dor é preciso remover a faca, eliminá-la.



Esta é a impossibilidade do sujeito colocar em palavras (a linguagem é simbólica) o que toma conta de seu corpo e seu pensamento. A angústia que se instaura na rachadura do ser, é onde a palavra não dá conta e o não dito surge em forma de ato.



A psicanálise trabalha com a fala, permitindo ao sujeito que transforme em palavra aquilo que sente, mas que ainda está no impossível de dizer. Pela palavra, oferecemos o simbólico como via de expressão, e mais, como possibilidade de dizer da sua angústia sem querer eliminá-la pelo ato, como faz o criminoso passional, que na apreensão do objeto real, submete-o ao lugar da angústia e mata como se matasse a própria angústia.



Elizandra Souza

Psicanalista

Diretora da Comissão de Ética do SINPESP

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quarta-feira, 30 de junho de 2010

O TRABALHO PSICANALÍTICO COM BEBÊS

A possibilidade de identificação de sinais de sofrimento no bebê é um dos grandes progressos da clínica atual. Existe uma unanimidade em considerar a psicopatologia do bebê uma perturbação do laço que une esse bebê ao seu cuidador pimordial. Existe possibilidades de trabalho psicanalítico envolvendo os bebês e seus cuidadores, assim como, as dificuldades afetivas acometidas pelas grávidas modernas, cercadas de objetivos e vontades nem sempre consonantes.

Os sintomas que mais apontam para a necessidade de um trabalho psicanalítico são aqueles que a medicina não encontra motivos ou quando as medicações parecem não trazer os resultados desejados, como por exemplo: recusa ao alimento, problemas com o sono, choros constantes e sem explicação, dificuldades na relação parental.

Teóricos como Winnicott e Françoise Dolto, já discutiam a relação mãe-bebê, portanto esta abordagem não é tão nova. Hoje, um dos métodos mais conhecidos de observação é de Esther Bick.

O tratamento na clínica psicanalítica com bebês implica na escuta paterna. Diferentemente do trabalho psicanalítico feito com crianças maiores, onde é possível fazer uma análise do simbolismo utilizados pelas crianças nos jogos, brincadeiras, desenhos, histórias. Com os bebês o trabalho é diferenciado, pois se instaura na relação.

Durante a gravidez, uma mãe pode passar por conflitos por causa das transformações corporais e psicológicas, e ainda, cria expectativas sobre o bebê e sua relação com ele e com o marido, que muitas vezes não correspondem com a realidade depois do nascimento. A mulher é recheada de inseguranças e medos, que não consegue manifestar de forma adequada e sente que precisa de mais apoio do que geralmente recebe.
Quando o bebê nasce, os pais são confrontados com a realidade, pois após o período de sonhos e fantasias, eles se encontram com o bebê real. Passam, então, ao exercício parental do cuidado, da exploração das emoções, do encontro com novos sentimentos. Por isso, as circunstâncias que rodeiam a gravidez, o nascimento e os primeiros momentos da vida do bebê podem ser psicologicamente desestabilizantes para os pais, mais precisamente para a mãe.
A forma subjetiva que cada mãe carrega sobre sua vivência infantil, sua relação com seus pais, irmãos, avós, assim como as representações e traços que mantém direcionam a forma de como será mãe. Tal qual o bebê, antes mesmo de nascer já carrega sua história familiar e já é falado pelos entes, se constituindo, posteriormente, através de todas estas características.
O comportamento do bebê tem ressonância com os pais ou cuidadores, mas principalmente com a mãe. Suas histórias de vida, suas formas discursivas, suas constituições simbólicas são fatores primordiais na representação comportamental do bebê.
Os bebês precisam de alguém que exercendo a função materna, possa, além de trocar e alimentar, dar suporte afetivo às suas necessidades. Às vezes falta à mãe imprimir no seu filho a possibilidade de um sujeito. Muitas mães não conseguem dizer o que seus filhos querem ou por que eles choram. O trabalho com bebês supõe que elem se expressam e, apesar de não falarem, eles têm uma linguagem.

O tratamento psicanalítico na clínica com bebês segue a via da relação, por isso não é uma escuta parcial ou unilateral, mas uma escuta de posicionamento. É necessário o entendimento de uma série de elementos que caracterizam esta relação bebê-pais, como por exemplo, o lugar que o bebê ocupa no discurso dos pais. Ao psicanalista cabe um tipo de intervenção que visa oferecer situações onde seja possível produzir efeitos para constituição deste bebê.

Elizandra Souza, Psicanalista, Professora de Teoria Psicanalítica, Diretora da Comissão de Ética do SINPESP (Sindicato dos Psicanalistas do Estado de São Paulo), autora do livro “Aproximando-se da psicanálise num jogo de perguntas e respostas”.
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terça-feira, 29 de junho de 2010

Futebol: da paixão ao fanatismo

Em época de Copa do Mundo, todos os olhares se voltam para o futebol e suas influências. Torcedores de todas as idades, classes e oriundos dos mais diferentes lugares se juntam com um único objetivo – assistir a seleção. O futebol é um esporte sem barreira social, e pelo contrário, tem o poder de unir pessoas dos mais diversos aspectos sócio-econômico-cultural, mas com um mesmo objeto de amor – seu time.

É, também, neste momento que surgem as mais diversas teorias que tentam dar conta deste fenômeno tão diferenciado que move milhões de pessoas em todo o mundo. Das teorias via biológico às teorias mais filosóficas, todas dão pelo menos uma explicação sobre o que acontece com o indivíduo que torce.

As vibrações e o nervosismo na hora dos jogos caracterizam-se como os principais componentes do torcedor, mas, por outro lado, podem revelar muito mais do que uma simples admiração. Inexplicavelmente, muitas formas de dedicação ao time ou ao jogo são condutas observadas em torcedores mais frequentemente que nos próprios jogadores do time.

O sujeito torcedor joga pelo outro (jogador) através do olhar e da emoção. Se em cada torcedor há um técnico, mais ainda, há um jogador, e mais, há um conhecedor. Todos, cada qual sob sua própria perspectiva vislumbra um jogo melhor, uma escolha técnica melhor, um posicionamento excelente de cada jogador. E sob seus próprios elementos já conhecidos e postos, constrói novas teorias, que em geral, divergem das utilizadas em campo, principalmente quando seu time perde.

Após cada jogo, são intermináveis os debates entre profissionais e leigos, sempre dando conta de um inexplicável, resolvendo o que não há solução, na tentativa de preencher o vazio deixado pelo jogo.

Apesar de toda esta disposição das pessoas que torcem, devemos pensar sobre o que representa o futebol, principalmente, no Brasil. Talvez o futebol brasileiro traga consigo a marca do reconhecimento, da existência, a marca da possibilidade de se representar ao resto do mundo, longe da figura selvagem que éramos submetidos.

O Brasil passa a ser reconhecido por seus títulos e seus jogadores. Há no mundo quem conheça Pelé, mas não saiba nada sobre o Brasil. Nossa vantagem em copas do mundo e outros títulos mundiais, nos fizeram reconhecidos como o pais do futebol e, se nisto contamos vitória, também pede uma reflexão sobre o que pensam os brasileiros em relação a forma como são vistos pelo resto do mundo.

Paramos cidades inteiras para assistir aos jogos da copa; a economia nas cidades mais importantes do pais parou: empresas privadas, bancos, serviços e até o trânsito fizeram silêncio para “sua majestade o futebol”. Mesmo carregados de controvérsias frente ao time ou as táticas, os brasileiros se submeteram ao futebol.

Seria então, o futebol a salvação da pátria? Deveríamos então, utilizar o futebol como característica política para desenvolver na população o tão desejado sentimento de patriotismo? Qual será o real interesse dos brasileiros frente as suas questões sociais, econômicas e culturais se somente o futebol demonstra força de mobilização?

Dentre os questionamentos dessa fragilidade emocional do brasileiro perante o futebol, trago à tona as relações de fanatismo e agressividade tão presentes nas partidas e depois das partidas.

Ao mesmo tempo, que mobiliza a população a um pseudo-patriotismo, o futebol, nos terrenos particulares de seus clubes, faz emergir entre muitos torcedores sentimentos de posse, egoísmo e intolerância, e caminham para uma forma de fascismo recheado de sofrimento, violência, totalitarismo, induzindo a destruição da comunidade social e do direito de escolha.

Este mecanismo que vigora pelo fanatismo já é considerado problema social, cultural, psíquico e, muitas vezes, até fisiológico. O fanatismo é degradante em qualquer aspecto que toma forma, pois ele por si só destrói, se não os outros, o próprio sujeito, que deixa de se relacionar com outros objetos do mundo para contemplar um único objeto.

O fanático é aquele que acredita que a única forma de ser feliz ou de viver é através de um símbolo idealizado, por exemplo, um time (ou mesmo a seleção campeã). Esta fixação idealizada pode surgir na infância com os exemplos e ensinamentos oferecidos pelos pais, familiares e a sociedade. Algumas formas de fanatismo podem dizer algo relacionado à fuga de realidade, visto que está ligado a um prazer muito particular. Portanto, ao fixar um símbolo ideal, ameniza-se os sofrimentos que a vida podem suscitar.

O fanático é impossibilitado de perceber as escolhas alheias, os gostos, o comportamento e os pensamentos das outras pessoas que são contrários aos seus e age com agressividade quando o que vem do outro agride ou ofende sua idealização.

Acredito que ao fazer uma reflexão sobre o futebol e suas particularidades, devemos voltar os olhares para todas as formas de manifestação atribuídas como consequência deste esporte, que tem sua atuação cada vez mais presente, justamente pela variedade e contradição de suas representações e manifestações.

Elizandra Souza é Psicanalista; Comissão de Ética do SINPESP; Professora de curso de Formação em Psicanálise; escreveu o livro “Aproximando-se da Psicanálise num jogo de perguntas e respostas”.
www.elizandrasouza.com.br

quinta-feira, 24 de junho de 2010

Abordagem psicanalítica da TPM

Apesar de todas as explicações feitas pela medicina, as questões relacionadas a este momento da vida da mulher ainda é crucial e suscita muitas perguntas. Porém, a psicanálise traz um outro olhar com relação à TPM.

Para a psicanálise existe relações mais profundas e particulares entre o momento da menstruação e as elaborações psíquicas femininas, tanto quanto é feito a relação entre sintomas e psiquismo, ou seja os conflitos inerentes da mulher e suas relações com o mundo e consigo mesma.

Há mais significações nestes momentos da vida feminina do que revelam as explicações puramente fisiológicas e de alterações hormonais, visto que, ainda que haja alterações físicas, as questões de posicionamentos, as instabilidades emocionais, os conflitos familiares emergem como se nestes momentos vigorassem tendências ao negativismo ou à baixa estima.

Existe um suporte simbólico que a menstruação oferece à mulher na representação social e cultural, que pende, mesmo nos dias atuais, às questões da maternidade. E nesta mistura de sintomas e conflitos, fica a mulher desestabilizada. A percepção da feminilidade, mesmo nas mulheres modernas, ainda é um enigma e surge nos seus discursos pelas vias da maternidade e do ciclo reprodutor.

Não é possível acreditar que a tensão pré-menstrual crie, simplesmente, os problemas sofridos pelas mulheres, sem fazer associação com as questões intrínsecas da vivência feminina. Os problemas relacionados ao trabalho, aos relacionamentos amorosos, aos filhos, ao seu próprio corpo, à família, frequentemente, são pontos chaves nos sintomas desta fase, principalmente, os sintomas psicológicos e emocionais.

Certamente não podemos desconsiderar as questões físicas e as alterações hormonais. Assim como, não podemos desconsiderar o sofrimento trazido pelos sintomas físicos (inchaços, dor nas mamas, cólicas, etc.) que devem, quando necessário, ser tratados com medicação.

Alguns autores colocam a tensão pré-menstrual como um evento biopsicossocial, pois atinge o corpo físico e emocional, atingem a mente nos aspectos cognitivos e reflexivos e atingem as relações sociais.

As mulheres reclamam de seus sintomas, mas muitas conseguem perceber quando e como estourar. Por exemplo, dificilmente uma mulher descarregará sua instabilidade emocional no chefe, mas fará com que o marido ou o namorado percebam sua irritabilidade, impaciência e sensibilidade exacerbada.

A TPM intensa sempre sugere que algo não está bem e é necessário que a mulher tente reconhecer suas insatisfações e seus conflitos para poder resolver seus verdadeiros problemas.


Elizandra Souza
Psicanalista
Diretora da Comissão de Ética do SINPESP
Professora de cursos de Formação em Psicanálise
www.elizandrasouza.com.br

Bulling – relações em perigo

Quando se fala em bulling, a primeira idéia que nos vem à mente é a agressividade, porém quando ampliamos nosso pensamento sobre este assunto vemos que por trás desta agressividade existe um número muito grande de outros sentimentos e emoções, que nem sempre é apreendido pelo discurso daquele que justifica seu ato.

Ressaltamos a influência da educação nestes casos, principalmente, na forma hoje, que se apresentam os comportamentos de crianças e adolescentes. Em todo o mundo, as taxas de prevalência de bullying, revelam que entre 5% a 35% dos alunos estão envolvidos no fenômeno. Porém, o bulling não está ligado somente às atitudes juvenis. Este comportamento hostil também acontece com adultos, muitas vezes como forma de defesa ou proteção.

O sujeito se comporta contrariamente ao que inconscientemente reconhece em si. As atitudes agressivas e hostis com relação aos colegas aparece como tentativa de mascarar seu próprio sentimento de inferioridade. Como animais acuados que atacam, ao invés de se renderem, os sujeitos considerados bullies não encontram outras formas de se posicionarem na vida, diante de pessoas ou situações, senão pela violência. Ele tem necessidade de dominar, de subjugar e de impor sua autoridade sobre outrem, mediante coação; necessidade de aceitação e de pertencimento a um grupo; de auto-afirmação, de chamar a atenção para si. Possui ainda, a inabilidade de expressar seus sentimentos mais íntimos, de se colocar no lugar do outro e de perceber suas dores e sentimentos.

Esta violência assume o caráter etiológico do violar, como se, realmente, apoderasse de algo do outro para assumir como seu. O bullie viola não só as leis, a moral e a disciplina, mas principalmente, viola o sujeito naquilo que ele mais tenta conservar que é o ‘direito’. Direito à integridade física e psíquica. Direito à fala e ao movimento. Direito à opinião, à criação de hipóteses e à discordância.

Por outro lado, sob o arcabouço de seu modo agressivo, existe um ser que sofre. E não sabe nada sobre seu sofrimento, pois ele não comparece após um ato violento. Seu sofrimento é anterior e seus comportamentos agem como um véu, que escondem, abafam e tentam anular sua dor.

Em psicanálise, quando falamos desta dor ou deste sofrimento, não falamos de algo consciente, tampouco que seja algo motivo de pena. Não é algo se pode justificar os atos agressivos, mas sim, aquilo que indica a sujeição, aquilo que diz do sujeito sem ele saber.

Estudar as causas de bulling incluem diversas matérias ou ramos do saber. As perspectivas sociais, educacionais, políticas, econômicas e subjetivas devem ser trabalhadas de forma interdisciplinar para tratar este comportamento, que não é recente, mas é atualmente muito freqüente.

A psicanálise traz mais um ponto de vista. Um novo olhar que atua naquilo que não é dito no discurso do sujeito, mas é produzido por este discurso. Mais do que escutar aquele que sofre o bulling, é preciso escutar o próprio agressor, para quem sabe, possamos entender a dinâmica deste processo de subjetivação.

Lacan, que frisa a idéia da responsabilidade do sujeito: “A verdade que a psicanálise pode conduzir o criminoso não pode ser desvinculada da base da experiência que a constitui, e essa base é a mesma que define o caráter sagrado da ação médica – ou seja, o respeito pelo sofrimento do homem.” (Escritos)


Elizandra Souza
Psicanalista
Comissão de Ética do SINPESP
www.elizandrasouza.com.br

domingo, 21 de fevereiro de 2010

COMO ALIAR AS DEMANDAS DOS NEGÓCIOS E AS EXIGÊNCIAS DA VIDA PESSOAL

COMO ALIAR AS DEMANDAS DOS NEGÓCIOS E AS EXIGÊNCIAS DA VIDA PESSOAL

Casa, filhos, cônjuges, trabalho, funcionários, metas, planejamentos, despesas mensais, impostos, contas, passeios, reuniões, um cineminha, um jantar a dois, o jantar de negócios, crescimento, estagnação... Como na antiga brincadeira do ‘cabo de guerra’, que no lugar do nó que separa um lado do outro, ficam as pessoas que precisam equilibrar as forças das obrigações, exigências e deveres trazidas pelos lados aparentemente opostos e que se colocam em determinadas posições, impossibilitados de dialogar.

O centro, o nó, o ponto de apoio desse ‘cabo de guerra’ é ao mesmo tempo o sofredor, afetado na forma mais integral e mediador, que deve (por obrigação) ter discernimento suficiente para deixar a balança equilibrada, para satisfazer ambas as partes, sem deixar buracos ou fendas, reajustar-se a cada ponto, a cada ângulo para que possa se encaixar perfeitamente em espaços antagônicos, como um peça extremamente flexível e adaptável.

Tarefa difícil esta de assumir ambos os lados de um jogo, sendo adversário de si mesmo e se desdobrando para fazer todos ganharem e nenhum se sentir subjugado ou subestimado, mas que infelizmente as pessoas não conseguem jogar de forma positiva, adequada ou suficiente integralmente.

Eu poderia dizer de maneira bem simplificada que basta apenas aprender a dizer “não”. E como muitos já devem ter escutado dos mais diversos e renomados conhecedores do desenvolvimento pessoal, principalmente, voltado à área profissional e de recursos humanos que “fazer escolhas e aprender a dizer não uma estratégia imprescindível para poder administrar sua vida com mais propriedade.

Está certo, sabemos! “Dizer não”, “fazer escolhas” torna nossa vida mais moderada e não sofremos tanto com as exigências externas. Mas será que realmente sabemos como julgar qual o momento certo de dizer não? Como precisar considerações e concessões? Quando medimos interesses desproporcionais, como família e trabalho por exemplo, é comum nos fincarmos numa encruzilhada, pois a única certeza que temos é que um lado sairá perdendo.

Aquele não que deveria ser sim naquele momento, mas que precisa ser não. Aquele não para aquela pessoa (ou situação) que você sabe toda a importância para sua vida, mas que não é possível ser sim. Como definir o que deve, pode ou precisa ser renunciado? Por que é tão difícil e doloroso abdicar de determinadas coisas, principalmente, no momento em que tudo na vida deveria ser mais claro? Será que ter certeza do que se quer e de onde se quer chegar é realmente garantia e segurança necessária para tomar decisões, fazer escolhas e, mais do que isto, renunciar?

São anos dedicados ao crescimento, progresso, construção; anos de planejamentos sólidos e respostas prontas e certas às perguntas como: o que você quer para seu futuro? Quem você quer ser? Onde quer chegar? Que família quer ter? E num certo momento tudo se concretiza, de uma maneira ou de outra, mas também surge a confirmação de que nada se vive por inteiro, a completude é impossível e que os motivos nem sempre bastam ou garantem a tranqüilidade da decisão.

A insegurança, antes gerada pelo ‘será que conseguirei?’, hoje se instaura no ‘será que estou fazendo a coisa certa?’ As respostas que justificam os atos surgem em forma de pensamento ou voz interior que dizem “sim, está fazendo a coisa certa”. Há razões suficientes para se saber certo do que faz e servem como base estruturante para que, na cisão de todo homem, um lado fique firme e orgulhoso de si mesmo.

Mas, enquanto cindido, o homem carrega consigo um ponto de interrogação que insiste em se presentificar como dúvida constante, insiste em não permitir que as justificativas bastem, mesmo sendo reais ou plausíveis. Aparecem, então, as dúvidas ‘será quê?’; ‘mas e se...?’; ‘talvez fosse melhor...’

Esta cisão pode ser bem percebida nos períodos de final de férias, quando a dor e dúvida emergem na vontade de ficar mais um pouco com a família, no saber que até as próximas férias há muito tempo. Contemplar a família, o lazer, o espaço pessoal também não foi completo, ainda resta alguma coisa. A dor do preciso, mas não quero, feito criança entre o estudo e o brincar. É uma dor diferente porque não é uma simples dúvida sobre qual caminho tomar, pois a consciência e o amadurecimento já não permitem a escolha entre dois caminhos. A dor está na renúncia e na recusa que acomete o ser e não o inspira.

É mais fácil quando a dedicação é exclusiva, quando os valores do sujeito estão direcionados a propósitos mais unilaterais e, mesmo que existam outras coisas, estas apenas permeiam ou recheiam a vida do sujeito, que mesmo sendo importantes, não são fundamentais. Ou, pelo menos, este sujeito em específico, consegue conduzir suas vontades e objetivos desta forma e, portanto, não sofre.

Entretanto, a maioria das pessoas não são assim. E, talvez seja até uma questão cultural, pois não temos a tendência de valorizar a família, o lazer, o descanso, o pessoal. Não aprendemos a viver fundamentalmente para o trabalho e para o dinheiro. Isto é tão forte e complexo que muitas pessoas se sentem confusas e perdidas quando anseiam a possibilidade de cargos mais elevados porque aceitar é saber do afastamento da vida pessoal e recusar é o temor de não ser compreendido e ser visto como alguém que não se empenha e não tem a mesma dedicação pelo trabalho e pela empresa.

Você, enquanto nó – o nó do cabo de guerra – que não se desfaz e só persiste como emaranhado de fios ou bolo de dúvidas e idéias, e assim se põe diante de expectativas e vontades, certamente frustra muita gente e frustra a si mesmo porque percebe que não pode tudo, que não atinge a perfeição, porém tem a certeza que o equilíbrio é sempre momentâneo.

Fotos do Lançamento pelo link:

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