quarta-feira, 18 de julho de 2012
O PSICANALISTA
É
o profissional que aplica os princípios, os postulados, as técnicas e os
métodos da Psicanálise no tratamento ou na prevenção de distúrbios psíquicos de
natureza inconsciente.
A disponibilidade do psicanalista é a de quem deu o corpo para estar presente
ausente na escuta de alguém que sofre e quer ser libertado de seu sintoma. Este
sintoma é a dor de uma realidade, que diz sobre o mais íntimo, o mais estranho
e o mais ignorado.
O analista é aquele que leva a sério esse
sintoma insuportável, que não procura imediatamente recuperar ou curar pelos requisitos de
conformidade social. Não há compaixão ou caridade. O psicanalista sabe o que é
um sintoma, advindo das palavras que constituem o sujeito do inconsciente. O
psicanalista é aquele que espera pelo que será dito e não dito pelo sujeito
analisante.
Partindo do pressuposto de conhecimento que
atribuímos ao Outro – do padre ao médico, da mãe à professora – o que distingue
é o modo que este saber é concedido ao analista, pois este não se reduz à
sugestão. O psicanalista é somente uma suposição de saber e não um lugar
definido.
O psicanalista é aquele que oferece o nada ao
sujeito, um nada que é da ordem de restauração. Não impor material de trabalho,
não ditar o desejo do outro, não apresentar ruminações mentais são deveres do
analista e direitos de recebimento do analisante.
O analista deve aprender a esperar. Sua posição é calar-se diante da
demanda do outro. No seu silêncio é que o analisante pode tomar a medida de
própria verdade inquestionável e irredutível
que se apresenta em seus sintomas.
2 – A formação do psicanalista
A
psicanálise somente resiste pela transferência. Sua práxis se ancora na
transferência para existir. Esta transferência se coloca no processo
psicanalítico e na transmissão de saber. Não há formação sem transmissão de
conhecimento.
Possui
critérios e procedimentos próprios para a formação plena do profissional, que
em regra incluem três atividades indissociáveis: os cursos teóricos, a
supervisão de casos e a análise pessoal.
O
reconhecimento do método psicanalítico e de seus seguidores reafirma a eficácia
das sociedades psicanalíticas na transmissão e formação.
3 – O sentido da clínica na psicanálise
A
prática clínica existe porque sempre há um sujeito que apresenta uma queixa e
que quer saber sobre seu não sentido. O sofrimento psíquico apresenta valor
negativo socialmente, por isso, as pessoas tendem a não dizer exatamente o que
pensam, fantasiam ou lembram para qualquer pessoa e produzem formas mais
concretas (ou mensuráveis) para apresentar seu sofrimento. A procura por um
profissional aparece, justamente, porque existe a necessidade de ser olhado
para além do que os outros (familiares, amigos, médicos, etc.) conseguem dar
conta.
Diferente
da clínica médica ou psicológica, onde têm seu saber voltado para o conhecimento
da definição sintomática, onde a doença deve ter suas características
enumeradas e ordenadas, de tal forma, que será possível nomeá-la, a psicanálise
dirige seu saber pelo não saber e escuta o que o sujeito tem a dizer sobre seu
sintoma, na intenção de permitir que o sintoma diga do sujeito, ou seja, do que
o sintoma quer dizer.
A
clínica, para a psicanálise, tem a ver com a relação sujeito e objeto a nível
do discurso. O analista, na sua prática clínica, guia-se pelo simbólico, mesmo
quando o sintoma que se apresenta é corporal, e mesmo quando há necessidade de
intervenção médica, ainda sua via é discursiva e simbólica.
“Poderíamos
dizer que um dado indivíduo procura a clínica ou qualquer outra espécie de
ajuda porque se encontra aprisionado em um circuito pulsional, ele não consegue
forjar novos caminhos a partir do contato com o mundo externo... A psicanálise
nos alerta sobre os embaraços de um tratamento que se restrinja a atuar
exclusivamente no campo do eu.”(Adalberto Santos)
A
atividade clínica não pode ser reduzida a terapêutica, pois a minimização de
sofrimento ilude o analista e sujeito, impedindo-o de dar conta de seu
simbólico. Apresentar ao sujeito meios externos de tratar o sofrimento, através
de técnicas diversas, para que este aja de maneira específica ou apropriada,
conduzindo-o ao ajustamento de um padrão ideal, torna-se antiético, na medida
em que, o analista não deve servir de parâmetro de bom comportamento ou de
saúde mental.
“Não
há como ele dizer ao sujeito para agir desta ou daquela maneira, pois se de
fato devemos levar a sério a arbitrariedade do simbólico, não há um padrão
ideal ao qual os indivíduos devem ser ajustados. E quem quer que seja que
procure um atendimento psicológico tem de se haver com isso. É somente na
medida em que é dado ao sujeito falar sobre seu sofrimento é que ele pode
encontrar, ou não, seus próprios caminhos... a clinica comporta dimensões
éticas que não podem deixar de ser levadas em conta.” (Adalberto Santos)
4 - O que dizia Freud sobre a formação
psicanalítica
Em "A questão leiga"(1925), pág. 278: "É injusto e inconveniente tentar compelir uma pessoa que deseja libertar alguém do tormento de uma fobia ou de uma obsessão a seguir a estrada indireta do currículo médico". Na pág. 286, “... Minha tese principal foi no sentido de que a questão importante não é se um analista possui um diploma médico, mas se ele recebeu a formação especial necessária à prática da análise... Um esquema de formação para analista... deve abranger elementos das ciências mentais, da psicologia, da história da civilização e da sociologia, bem como anatomia, da biologia e o estudo da evolução." Na pág. 277: " Para o paciente, portanto, é uma questão de indiferença se o analista for médico ou não..." Na pág. 281: "Eles devem aprender a análise da única maneira possível - submetendo-se eles próprios a uma análise." Na pág. 288: " Mas objetar-se... que a psicanálise... for considerada uma subdivisão da medicina ou da psicologia, isto será uma questão puramente acadêmica e de nenhum interesse prático." - justifica a psicanálise como livre para estudo, porém com uma formação específica, principalmente para a prática.
"Abreviar
o tratamento analítico é um desejo justificável, e sua realização, como
aprendemos, está sendo tentada dentro de várias orientações. Infelizmente,
opõe-se-lhe um fator muito importante a saber, a lentidão com que se realizam
as mudanças profundas na mente - em última instância, fora de dúvida, a
‘atemporal idade’ de nossos processos inconscientes.” - não prometer
terapias breves, nem estipular tempos.
5 - Diferença entre psicólogo,
psiquiatra e psicanalista
O termo “psi”, bastante utilizado pelas pessoas,
muitas vezes pode ser permeado de confusão quanto aos significados,
principalmente quando se refere aos profissionais
indicados por este termo: psiquiatra, psicólogo ou psicanalista.
“O trabalho psicanalítico permite ao sujeito entrever o
modo segundo o qual se concretizou ou se substantivou a falta que o constitui
estruturalmente como ser falante.” (Escola da Causa Freudiana)”
6 – A conduta do psicanalista
Com
tantas alternativas técnicas, muitos profissionais se confundem em suas
práticas e ficam perdidos, tornando seu trabalho equivocado. Quando esta
confusão aparece no trabalho de um psicanalista, vemos que o que mais falta é o
conhecimento da própria técnica. Erros comuns como: acreditar que realmente
sabe algo sobre o outro; acreditar que pode ensinar um modo de vida; acreditar
que existe um universal como na medicina, onde a mesma conduta cabe a todos;
entre outros aparecem como forma de propaganda, mas que indica a
impossibilidade de posicionamento psicanalítico.
As
práticas terapêuticas, cala o sintoma, pois vai pela via do alívio do
desprazer. Tanto analista quanto analisandos esquecem de escutar o que o
sintoma quer dizer. Primam pela conveniência dos indivíduos e deixam de olhar o
sintoma ou a doença como o meio apresentado para a subjetivação.
“Não há nenhuma definição possível da terapêutica a não
ser a de restituição de um estado primeiro. Definição esta justamente
impossível de ser formulada em psicanálise.” (Escola da Causa Freudiana)
Não
cabe ao psicanalista a terapêutica clássica, pois esta prejudica o sintoma. Se
o sintoma se apresenta é porque existe um ‘a quem’ ele se endereça. A
psicanálise é a única possibilidade deste sujeito, pela transferência, não se
enganar e não ser enganado pelas posições que o discurso terapêutico oferece.
“Preocupar-se em não prejudicar o sintoma permite alçá-lo à dignidade de um
signo que não o amputa de sua duplicação nativa.” (Escola da Causa
Freudiana)
"A técnica, contudo, é muito simples. Como se verá, ela rejeita o emprego de qualquer expediente especial (mesmo o de tomar notas)... 'Ele deve simplesmente escutar e não se preocupar se está se lembrando de alguma coisa" (Artigos sobre a técnica - Recomendações aos que exercem a psicanálise, pág. 149/150 - 1914) - não há necessidade de utilização de nenhum outro meio, senão o da fala.
7 – O que diz o MEC sobre a formação do
psicanalista
Desde
meados de dezembro de 2009, esperamos do MEC uma resposta sobre os cursos de
Psicanálise. Não existe, a priori, um planejamento curricular sobre o curso.
8 – O que diz o CRP e o CRM
a)
Existe ementa do Conselho Federal de Medicina (Brasil), não reconhecendo
Psicanálise como especialidade médica, e a proibição de médico intitular-se
médico-psicanalista. O Conselho Federal de Psicologia emite (Brasil)
"constitui-se a Psicanálise num campo autônomo à psicologia, mas que com
esta não se confunde. Assim, o exercício da Psicanálise não pode ser privativo
de psicólogo", e acrescenta uma ementa "A Psicanálise não é
reconhecida como uma profissão, existindo como uma especialidade da qual
participam profissionais de diferentes formações".
b)PARECER
N° 02/98, DO CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA, PROCESSO CONSULTA N° 4.048/97 DE
11/2/98
9 – Importância da educação continuada
Assim
como não conseguimos aceitar que um analista não tenha experienciado uma
análise, não podemos aceitar que um analista se limite ao básico da teoria. A
teoria psicanalítica somente acontece pela transmissão e, por isso, por via
também inconsciente, além do posicionamento. O psicanalista está sempre se
deparando com o cerne da Psicanálise, ou seja, a sua dimensão da falta, esse
descentramento do homem que não é dono do seu destino, nem sequer da sua
palavra
Um
psicanalista para existir precisa se colocar, ele não existe somente numa sala
fechada. Seu desejo precisa ser posto à prova. O paradoxo da existência da
psicanálise reside no fato de que o sujeito, enquanto sujeito do inconsciente,
é constituído como uma questão cuja própria estrutura se define por não ter uma
resposta e nem receita pronta ou acabada.
10 – O diploma não significa nada
Para
Lacan “o que define o analista é seu ato, não seu título, nem fato de receber
pacientes. Não nos tornamos psicanalistas, verificamos se fomos.” (Pertinências
da Psicanálise Aplicada)
O
elemento central na formação de um psicanalista é sua análise pessoal,
didática, articulada a um longo processo de supervisões e seminários clínicos e
teóricos, cuja duração e resultados são impossíveis de serem determinados a
priori. Lembramos que desde a sua fundação a Psicanálise tem consolidado sua
prática, sua ética e projeto de formação do psicanalista através das Sociedades
de Psicanálise, sendo que o estabelecimento das condições normativas para
regulamentar a função de psicanalista tem sido prerrogativa das referidas
Sociedades.
A
análise do pretendente a psicanalista ou analista tem de ser feita, ela tem de
ser espontânea e solicitada pelo candidato, pois só compreenderá melhor a
psicanálise quem já passou por ela, não se pode falar de amor se nunca o
sentimos ou nunca o vivemos,
11 – O psicanalista conduz a análise até
onde foi sua própria análise
Antônio
Quinet, em seu livro “A descoberta do inconsciente”, considera que “o sujeito
em associação livre, é um sujeito dirigindo-se ao analista”. A presença do
analista é a possibilidade de aparecer o inconsciente.
O
papel do analista é o pior ou o impossível, pois se carrega de vazio para que o
inconsciente do outro se presentifique. A escuta, deixando de lado, para fora
de si, seus conceitos do bem e do melhor, deixando para fora de si seus
conceitos e formas de ser, agir ou existir. Só assim, o analisando pode
comprometer seu inconsciente para esta relação.
“O que o sujeito conquista
na análise não está no nível dos bens, nem do acesso à Coisa. É, na realidade,
sua própria ‘lei’ (regra), a verdade de seu desejo, o que rege seu princípio de
prazer/desprazer. Isso ao mesmo tempo em que o sujeito se dá conta de que é
castrado, ou seja, de que a falta é constitutiva e, portanto, por mais que se
saiba acerca do desejo, não saberá nada além de suas marcas. A falta sempre
existirá e nunca haverá resposta para o desejo. A ética da psicanálise se dá,
portanto, em relação à ação e ao desejo que a habita.” (Camila Junqueira)
“O psicanalista pela sua própria experiência como
analisando, acerca da impossibilidade da verdade ser inteiramente dita, tem a
função, também impossível, de levar o analisando a dizer o que não pode ser
dito, a bem dizer o seu sintoma. Eis a ética do bem dizer.” (Débora Pimentel)
12 – Não há resistência senão a do
analista
O
desejo do analista é um desejo de saber e não deve ser confundido com o desejo
ingênuo de curar. Freud nos adverte acerca do analista, dos perigos sobre o
desejo de curar, a ambição de fazer o bem. A ética da psicanálise é a ética do
desejo. O furor curandis não levaria em conta o desejo inconsciente do sujeito
e seria uma manifestação de resistência do próprio analista, produzindo um
saber no analisando, aquém da verdade. “Não há mais que uma única resistência, a
resistência do analista.” (Débora
Pimentel)
Para
o analisando a destituição subjetiva implica também em desalojar o analista do
lugar de sujeito suposto saber e o deixa reduzido à condição de resto do
processo analítico, quando nenhum significante vem a representá-lo (des-ser do
analista).
Devemos
pensar que o declínio da psicanálise só pode acontecer se houver declínio da
posição do analista. Quando o psicanalista acredita na sua prática e resiste às
demandas de conforto e às intervenções de anulação de sofrimento ou pseudocura,
pode fazer a psicanálise ser reconhecida, enquanto uma ética.
Atravessar
a fantasia é confrontar- se com a castração escondida lá. É confrontar-se com a
revelação de que não existe um significante sexual para um outro significante
sexual: não há relação sexual. Antônio Quinet diz que a “proposta analítica
é levar o sujeito da impotência ao impossível da relação sexual” (13).
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