ELIZANDRA SOUZA

quarta-feira, 26 de outubro de 2011

O sujeito da linguagem

A linguagem, geralmente, é concebida como instrumento natural de comunicação humana, que surgiu na própria evolução da espécie, e é tão contingente quanto ela mesma ou qualquer dos recursos que ela utiliza para a sua preservação.

A aquisição da linguagem é caracterizada por etapas que vão do balbucio e da constituição dos primeiros repertórios de sons até a emergência da consolidação de formas gramaticais e da constituição de uma variedade de palavras.

Para melhor compreender o percurso da aquisição da linguagem, é importante e fundamental, levar em consideração também a natureza e o nível do desenvolvimento da linguagem na criança, em termos de conhecimento e de funcionamento.

Em idades precoces a comunicação é, sobretudo afetiva e inicialmente extra-verbal. Passando por seus corpos e refletindo sentimentos e emoções. Esta comunicação se realiza, sobretudo durante os cuidados maternais. O trabalho desta comunicação é estabelecer um diálogo, um acordo afetivo que se caracteriza pela harmonia e sincronicidade dos envolvidos (criança e cuidador ou mãe/bebê), que acontece durante os cuidados e as brincadeiras.

A criança em idade pré-escolar ainda não adquiriu o todo da linguagem, ou seja, ainda não domina todos os símbolos e articulações fundamentais da linguagem, o que permite-se manipular diversos elementos da linguagem. Dentro do contexto escolar é favorecido o ensinamento da língua e de seus instrumentos de conhecimentos através de recursos pedagógicos.

A utilização de substituições e combinações na língua caracteriza movimentos da criança com relação à linguagem. Num primeiro momento os enunciados da criança precisam ser interpretados pelo adulto para ter uma significação e prosseguimento. No segundo momento a criança toma a fala do outro como referência, e incorpora fragmentos dessa fala, mas já demonstra certa singularidade. Disto decorre posteriormente a fala mais complexa da criança com as pausas e interferência, assim como as tentativas de argumentação, numa posição de possibilidade de se escutar.

A linguagem não é a simples comunicação, mas o que insere o sujeito em seu meio, pois cada palavra não significa em si, mas traz o aporte de significantes necessários para sua constituição. São estes significantes que revelam o que é o sujeito. Porém os significantes surgem e são atuantes somente na presença de um outro, tanto de um outro significante como de um outro – pessoa – a quem se dirige, um outro sujeito.

A linguagem é uma produção determinada pelo momento histórico, nas suas contradições sociais e conflitos ideológicos – de classe, de gerações, de gênero, de grupos étnicos etc. Ela é produto inconsciente, pré-consciente e consciente desse jogo do ser com o mundo.

A tomada de palavras sugere um aporte de significantes, que vão surgindo pelos processos de identificação dos elementos inscritos no inconsciente, sejam imagens ou símbolos. De acordo com Lacan a identificação imaginária tem a ver com a origem do eu, enquanto que a identificação simbólica origina o sujeito do inconsciente, que vai fazer relação com a imagem do eu.

Quando diz de si através do ‘eu’, o sujeito aponta sua inserção na história, deslizando sob os significantes e seus significados. O sujeito é representado por um significante para outro significante. A linguagem instala a ordem simbólica no sujeito e possibilita a produção dos significantes que guiaram sujeito no decurso de sua vida e nos discursos. Todas as formas de expressão do sujeito são derivadas da cadeia de significantes.

Para a psicanálise aprender a ler e escrever tem a ver com sentido. Como a linguagem é fundamental para a constituição do sujeito, o aprendizado necessariamente passa pelas questões afetivas, de subjetivação. O inconsciente não existe sem linguagem e a linguagem é condição de existência do inconsciente, portanto aprender a operar com as letras e as palavras têm relação com a subjetividade. A criança que ainda não encontrou o caminho da subjetividade, que não operou com o recalque, nem entrou no campo do simbólico, fica impossibilitada de aprender.

Através da palavra, o sujeito apresenta o que está latente no seu inconsciente, que marca sua falta, revela-o na sua incompletude e denuncia seus conflitos. A percepção de si mesmo e da forma como o sujeito se expressa, também aparece nestes momentos em as palavras se manifestam.

Nenhum comentário:

Postar um comentário