ELIZANDRA SOUZA

sexta-feira, 24 de junho de 2011

A impossibilidade de se gritar por "justiça"

Um homem jovem, retraído, sem amigos, nem vida social, que como todos os sujeitos pós-modernos exercita sua cidadania pela internet, onde é também o lugar de se fazer existir no mundo, de se expressar. Entra na sua antiga escola para executar um massacre, que foi planejado em detalhes. A escolha pelo local, de certa maneira, mostra que esta escola deixou marcas na formação deste sujeito. E, ainda que se tente usar como justificativa, o bullyng, para a raiva demonstrada, não é disso que se trata, a não ser que queiramos continuar buscando explicações imprecisas e frágeis.



A escola participou da constituição deste sujeito, mas não foi o único elemento constitutivo. Há toda uma construção subjetiva que existe desde as primeiras relações e trocas afetivas. Este sujeito foi dito antes mesmo de nascer e, a partir desta inserção na linguagem, existe a possibilidade de construção subjetiva. Ele primeiro é dito, por pais, familiares, cuidadores etc, para depois poder se dizer, ou dizer de si, colocando em palavras aquilo que sente, pensa ou imagina. O possível e o impossível de dizer se colocam e se deslocam na formação do sujeito. Estará com ele durante toda sua vida.



O assassino queria dizer alguma coisa. E disse. Posiciona-se como palestrante (aquele que dirá) e choca com sua fala através de armas e muitos tiros. Torna ato o indizível.



Numa carta, onde mistura justificativas irracionais, religiosas e sociais, dá a dimensão de seu delírio. Com o perfil considerado "esquisito" – o estranho que não se comunicava como estamos acostumados, que não se relacionava, que trazia identificações e introjeções diversificadas e controversas –, o assassino não encontrou um caminho socialmente ideal para exteriorizar sua condição subjetiva.



O esquisito não sabia lidar com o simbólico, não foi barrado simbolicamente, mas o teve no concreto (em psicanálise, temos que a possibilidade de fazer relação com o mundo se dá pelo simbólico, ou seja, entendemos o mundo e as pessoas de forma simbólica, assim aprendemos, por exemplo, os limites e o respeito). O tiro que para o sujeito também faz vácuo na fala da população.



Não há mais sujeito agressor, não há mais algoz, ele morreu. Por ele ou pelo policial, não importa, sua morte cala os sujeitos que querem gritar por "justiça". Impossível esbravejar "covarde", "assassino", pois ele não está lá para escutar. O mesmo tiro que barra o sujeito, cala os outros ao redor. Torna fenda, abre a dimensão do vazio e traz à tona o impossível de dizer.



Como na análise, falaremos deste impossível até cansarmos. Tentaremos encontrar palavras para dar conta deste vazio, buscaremos, através de especialistas as explicações para este comportamento. Caminharemos pela história do sujeito, pelas suas relações, pelos seus testemunhos escritos e falados. Tentaremos encontrar algum ponto que seja ‘chave' para saber por que este sujeito fez ‘isso'.



Justificamos, principalmente, através da loucura, os atos irracionais de certos homens e mulheres. Há ações que são tão distantes daquilo que consideramos ‘normal', que somente um ser de mentalidade distante seria capaz de fazer. Estamos acostumados a considerar loucura todas as ações, atitudes e comportamentos que fogem do ‘comum'.



Nosso senso de ‘ordem social' é incapaz de aceitar que sujeitos iguais a nós possam ter atos irracionais como vemos quase todos os dias. Precisamos acreditar que o sujeito faz uma ruptura com o social. Ainda não acreditamos na maldade do ser humano. Temos a idéia de que somos todos bons. Mas observamos que não são, simplesmente, as condições que o meio oferece, que nos constitui, e sim, as relações que temos com estas condições.



Por isso, além da loucura, como ruptura do sujeito com o social, também tentamos encontrar justificativas pelas doenças psiquiátricas ou neurológicas, ou ainda, pelas questões sociais e educacionais. Como se todo aquele que cometesse um ato irracional sofresse de algum mal, que muitas vezes desconhece. Mas pior que isso, seria considerar o contrário como verdade, ou seja, aqueles que não cometem atos irracionais, não sofreriam, nem nunca teriam sofrido qualquer mal físico, social, psicológico ou educacional.



Quando pensamos por este viés, logo aparecem diversas outras histórias de pessoas que teriam sofrido bullyng, maus tratos pelos pais ou professores, que não tiveram condições de estudar, que viveram na miséria, que foram criados em abrigos, e que não se utilizam da violência ou da irracionalidade para se expressarem. Por outro lado, temos de maneira crescente, o aparecimento de pessoas que mesmo sob as melhores condições, econômicas, sociais, familiares, educacionais, resolvem se manifestar de forma sórdida e cruel.



O que na realidade se efetua no comportamento do sujeito é o jeito com que ele se relaciona com as condições que lhes são oferecidas, e esta relação, entendimento e expressão se dá pelo simbólico.



Mas o simbólico não dá mais conta de expressar o sujeito. Antes usávamos o corpo, principalmente, através das patologias, para expressar nossos conflitos. Já usamos também o grito, o choro, os xingamentos para expressar nossa raiva, nossos descontentamentos.



Hoje, o concreto aparece intensamente. Não é possível somente querer esquecer alguém, é necessário desaparecer com esta pessoa. Não é possível somente xingar alguém, é necessário atingir o corpo, fazer sofrer, matar. Não é possível somente perder, é necessário que o objeto perdido seja destruído completamente. As ações concretas, violentas, agressivas surgem com força, e não só demonstram a fragilidade do entendimento simbólico do mundo e suas leis, como também, incidem em ações para imposições de limites mais concretos.



Serão necessárias muitas palavras para que as vítimas não adoeçam. E mesmo que nem todas as palavras do mundo possam operar no sofrimento dessas pessoas, é preciso falar. É preciso que o grito calado e abafado encontre sua voz. E em meio a tantas formas simbólicas de linguagem, cada sujeito encontrará a sua maneira de expressar sua dor e sua indignação, seja conversando, escrevendo, pintando, dançando, cantando.

Algumas das Participações em Programas de TV

Programa Hoje em Dia: http://entretenimento.r7.com/hoje-em-dia/noticias/maes-rigorosa-e-liberal-conversam-sobre-a-educacao-dos-filhos-20110214.html



A Liga – Funk: http://www.youtube.com/watch?v=ZpiN-l6A4gI




A tarde é show: http://www.youtube.com/watch?v=t9yHve_CWLQ




Você Bonita: http://www.youtube.com/watch?v=s8elMCc_F5U&feature=related



Programa Vida Melhor: http://www.youtube.com/watch?v=Dj8skciAORc

Blog da Minha Pesquisa

http://projetovozadolescente.blogspot.com/